Na sexta-feira passada, foi apresentado no IV Congresso da SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) o estudo “A Qualidade da Democracia em Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos”. Este trabalho foi dirigido por Pedro Magalhães, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, e promovido pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e pela Intercampus. Os resultados principais conheceram bastante divulgação na imprensa, de acordo com o reconhecimento atribuído às associações envolvidas e aos seus membros e dirigentes.
Em síntese, encontrou-se pela negativa que os Portugueses têm baixa confiança nas possibilidades da diversidade na representação política; num acesso à justiça idêntico a todos os cidadãos e de que os eleitos correspondam às preferências dos seus eleitores. Pela positiva, apareceu que os Portugueses reconhecem a sua liberdade para “votarem em quem quiserem” sem se sentirem pressionados e que “as eleições funcionam como forma de responsabilização política”.
Estes resultados são muito relevantes e merecem ser reflectidos e discutidos. No entanto, devemos sabê-los enquadrar com precisão. É que este trabalho não é propriamente um estudo sobre a qualidade da Democracia em Portugal, como algumas reportagens e comentários parecem querer demonstrar. Isto, porque os seus dados não são indicadores estrutrais ou funcionais do nosso regime. Eles são sim índices sobre a percepção, opinião, sensibilidade ou grau de satisfação dos cidadãos Portugueses.
E do mesmo modo que não podemos tornar equivalentes os sentimentos de insegurança das populações com os índices reais da criminalidade, aqui não podemos realizar inferências directas de uma dimensão da realidade para a outra, do que é percepção para o que é real. Ou melhor, podemos fazê-lo, mas aí já não nos encontramos no terreno das ciências sociais, e teremos dado o salto para o da ideologia.
Por exemplo, eu reflicto sobre estes dados de uma maneira muito mais optimista do que aquela que tem sido veiculada na comunicação social. O aparente sentimento de descrédito da população Portuguesa, seja no acesso à Justiça ou na bondade dos políticos, é fruto de um elevado nível de exigência, aquele que os cidadãos das sociedades Ocidentais contemporâneas guardam geralmente para com os seus sistemas de poder. Afinal, e de acordo com as referências deste estudo, os próprios Espanhóis duvidam, e na mesma medida que os Portugueses, da aplicação igualitária da Justiça no seu País.
E convenhamos, nós, Portugueses e Espanhóis, neste como noutros domínios devemos congratular-nos com a posição priveligiada de que dispomos, quer em relação às sociedades de muitos outros Países, quer em relação às sociedades dos nossos Países de algumas décadas atrás. Claro que tudo isto são reflexões ideológicas, julgamentos de valor, mas tão defensáveis como perceber aqueles dados como índices da degradação da Democracia em Portugal.
Não estou a diminuir o estudo, como disse, com dados muito interessantes, um trabalho sério que nos entrega um retrato provocante sobre o estado de espírito da Nação. Mas quero respeitar a essência dos seus dados, no sentido de os compreender melhor e discutir mais esclarecidamente.
PS: Para finalizar, gostaria só de referir que penso “A Qualidade da Democracia em Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos” como um projecto muito mais impressionante na óptica da Psicologia Política, do que na da Sociologia. Aí, penso, o estudo avança ideias muito curiosas sobre os factores ou características fundamentais à satisfação dos cidadãos com o seu sistema democrático e que, espero, possam vir a ser retomadas por estudos futuros.
Frederico
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